quinta-feira, 13 de março de 2014

Supervisores, vamos estudar?

Compreendendo a importância do Supervisor Escolar como profissional indispensável no gerenciamento escolar, faz-se necessário refletir sobre sua atuação, atribuições, dilemas e qualificação.

Pensando por esta vertente, faremos mais algumas publicações de artigos, vídeos e entrevistas que visam colaborar e nortear o trabalho do destes profissionais.

Dez conteúdos indispensáveis à formação do coordenador pedagógico

Além de aumentar a oferta de formação continuada para os coordenadores pedagógicos, deve-se investir na qualidade dos conteúdos.

Dagmar Serpa (gestaoescolar@fvc.org.br)1 Identidade profissionalPara acertar o foco, ele precisa entender sua função na escola. Eliane Bruno lembra de um programa de formação da qual participou em que, por sua importância, um semestre era dedicado ao tema: "Induzíamos a uma reflexão sobre as atribuições do coordenador usando leituras de experiências práticas e promovendo um diálogo com a teoria." Para ela, a troca de experiência entre os pares nos encontros ajudou a atingir a meta.2 Concepção de formaçãoSe essa é a essência do trabalho da coordenação pedagógica, quem a exerce tem de ter consciência de que não basta encaminhar os docentes para cursos da Secretaria ou repassar programas prontos. O trabalho do dia a dia deve incluir o monitoramento constante das práticas em sala de aula. "A melhor forma de disseminar a ideia é debatê-la em encontros periódicos com profissionais da rede", diz Cybele.3 Relações interpessoaisPara ser articulador e formador, ele deve saber se relacionar bem. Só assim conseguirá observar a aula sem parecer um fiscal intrometido, apresentar críticas sem despertar raiva e integrar um professor novato. Para desenvolver a habilidade, é possível usar diferentes linguagens, como filmes e literatura, para aguçar a percepção e as capacidades de observação e de escuta. Pode-se recorrer à memória, induzindo cada um a lembrar vivências da sua trajetória e compartilhá-las com os colegas.4 Liderança e condução de grupoO líder pedagógico tem de ter competência para conduzir a equipe em reuniões de trabalho, conquistando a adesão de pessoas. Quem pensa não ter essa habilidade pode aprender. Há diferentes estilos de liderança e conhecê-los é a forma de buscar identificação com um e adotá-lo. E vale incluir na formação do coordenador o estudo de teorias e técnicas sobre o funcionamento de grupos - para saber, por exemplo, como alguém de personalidade marcante influencia os demais.5 PlanejamentoElaborar uma pauta produtiva para os horários de trabalho coletivo e para reuniões setorizadas, orientar os professores a planejar as aulas, o semestre e o ano e criar estratégias para melhorar o trabalho em sala de aula. O coordenador aprenderá tudo isso se contar com uma orientação técnica contínua, que funcione nos moldes de uma tutoria. No dia a dia, o supervisor pode fornecer conhecimentos gerais sobre planejamento e apresentar bons modelos.6 Estratégias de avaliaçãoPara ajudar os docentes a aprimorar o trabalho, o coordenador precisa saber observá-los em aula, analisando o conhecimento do conteúdo, a forma como ele é ensinado e as interações. A supervisão em serviço, como uma tutoria, é a melhor forma de fornecer parâmetros para ele criar suas ferramentas de acompanhamento.7 Instrumentos metodológicosAlguns documentos são essenciais para o líder da equipe docente. Explicar quais são eles e como guardá-los é indispensável quando se deseja um coordenador competente. Os planejamentos dos docentes, por exemplo, dão pistas sobre as necessidades de ensino que precisam ser supridas e devem ser arquivados, assim como o portfólio de cada turma, com relatos, fotos, produções dos alunos, registro de dúvidas e notas sobre avanços, que ajuda a avaliar a evolução de uma classe. Tudo isso pode ser arquivado por data ou tema. A Secretaria de Educação pode organizar seminários sobre o tema, mas é fundamental que os supervisores técnicos detectem as deficiências particulares no uso dessas ferramentas.8 Conhecimentos didáticosSó conhecendo as peculiaridades das diferentes fases de desenvolvimento da criança e do adolescente e a forma como se aprende em cada uma delas o coordenador é capaz de avaliar se os métodos usados em sala de aula são apropriados. Ele precisa ainda ter clareza sobre os mecanismos de assimilação dos adultos, pois conduz os docentes em um processo dinâmico, no qual eles ensinam e aprendem ao mesmo tempo. Seminários temáticos aumentam a bagagem teórica na área. Mas é a orientação contínua que permite identificar falhas e corrigi-las.9 Tematização da práticaConsiste na reflexão, à luz de teorias, sobre boas práticas em sala de aula - em geral, gravadas em vídeo. O objetivo é que o docente aprenda vendo modelos, pensando sobre eles e discutindo-os. Cabe ao coordenador fornecer a base teórica e indicar como aquele exemplo pode ser usado em sala. Para evitar constrangimentos, recomenda-se que o coordenador comece a implantar a estratégia usando gravações feitas fora da escola para só depois fazê-las com um docente da equipe com uma atividade anteriormente planejada em grupo. As instruções gerais podem ser fornecidas em um workshop com os profissionais de toda a rede, mas cada coordenador precisará de uma supervisão individualizada para implantar a estratégia formativa em sua rotina.10 Troca de experiênciasSe um professor fez um projeto de sucesso, outros docentes devem conhecer o trabalho. Portanto, o coordenador precisa saber documentar, sistematizar e compartilhar experiências. Isso pode ser feito na escola, com a criação de um arquivo de boas práticas aberto a consultas, ou na internet, com a organização de uma rede colaborativa, da qual docentes de outras escolas podem participar. De novo, poderá aprender a fazer isso com uma orientação individualizada.



Desvios de função do coordenador pedagógico

A falta de clareza sobre as atribuições do cargo bagunça a rotina do formador e traz sobrecarga de tarefas


Organizar os horários de uso da biblioteca, dar uma força aos funcionários na época de matrícula e conversar com os pais. Demandas demais e de todos os tipos vão parar nas mãos dos coordenadores pedagógicos, constatou a pesquisa O Coordenador Pedagógico e a Formação de Professores: Intenções, Tensões e Contradições, encomendada pela Fundação Victor Civita (FVC) à Fundação Carlos Chagas (FCC). Atolados em afazeres, muitos não conseguem atuar satisfatoriamente na formação em serviço dos professores, que é a sua função prioritária. Assim, esses profissionais assumem papéis equivocados, como o de "psicólogo" ou "relações-públicas", às vezes sem se dar conta disso.

Apesar de 87% dos 400 entrevistados em 13 capitais brasileiras na fase quantitativa do estudo terem apontado a gestão da aprendizagem como uma atividade da sua responsabilidade, só 17% citaram a observação da dinâmica da sala de aula - uma das principais estratégias formativas - como parte da sua rotina. Existem ainda 19% que declaram substituir pessoalmente, uma ou duas vezes por semana, algum professor que falta, quando poderiam apenas contribuir na criação de um plano para lidar com esse tipo de emergência. Já 26% reconheceram ser insuficiente o tempo dedicado ao projeto político-pedagógico (PPP), cuja criação coletiva se constitui numa atividade-chave no processo de aprimoramento da função docente. E uma parcela, embora pequena (9%), simplesmente não tem em seus afazeres nenhuma atividade relacionada à formação.

A pesquisa concluiu que eles se descuidam da essência do trabalho e se ocupam de tarefas secundárias porque falta clareza sobre qual é exatamente o seu papel. ''Os próprios coordenadores não sabem as fronteiras do seu papel e, por isso, aceitam todas as demandas que lhe são dadas, fazendo coisas demais por não terem a compreensão de que são formadores'', ressalta Ana Maria Falcão de Aragão, da Faculdade de Educação da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp). O quadro é de uma profissão que ainda está em processo de construção. ''Como não existe uma identidade constituída, o coordenador tenta delineá-la no dia a dia. Diante das imposições que surgem, ele faz o que acredita pertencer à sua esfera de competência'', diz Laurinda Ramalho de Almeida, da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP). Nem sempre acerta nas prioridades.



Coordenador pedagógico: o que fazer e o que não fazer

Veja quais atribuições o coordenador pedagógico precisa encarar como prioridade e quais ele não deve

Dagmar Serpa (gestaoescolar@fvc.org.br). Colaborou Iracy Paulina

O que fazer

Garantir a realização semanal do horário de trabalho pedagógico coletivo
78% afirmam reunir-se periodicamente com todos os professores, porém só isso não basta. É preciso ter tempo para planejar e tornar mais produtivos esses momentos.

Organizar encontros de docentes por área e por série
Só 27% declaram reunir os professores por disciplina, para tratar de conteúdos específicos, e 31% por ano, para conversar sobre as turmas.

Dar atendimento individual aos professores
Apenas 19% discutem com cada docente da equipe e sugerem novas estratégias de ensino, após observar as práticas pedagógicas em sala de aula.

Fornecer base teórica para nortear a reflexão sobre as práticas
Não mais de 31% apontam o preparo dos docentes como um dos principais problemas da coordenação pedagógica.

Conhecer o desempenho da escola em avaliações externas
47% dos entrevistados citaram um número que está fora da escala do Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb), embora a maioria afirme saber o resultado da escola. Mais do que ter o número, é essencial usá-lo para guiar o planejamento em equipe.

O que não fazer

Conferir se as classes estão organizadas e limpas antes das aulas
55% dos coordenadores realizam essa tarefa e 90% a avaliam como adequada à sua função, que pode ser delegada a um funcionário de serviços gerais.

Fiscalizar a entrada e a saída de alunos
72% dos entrevistados têm essa atividade na rotina e 91% a consideram apropriada, mas o controle deve ser responsabilidade de um funcionário treinado para a função.

Visitar empresas do entorno para fechar parcerias
54% gostariam de ter mais tempo para isso, mas o papel de relações-públicas é do diretor.

Substituir professores que faltam
19% dos entrevistados fazem isso uma ou algumas vezes por semana. Sua função, porém, é ajudar a direção a montar, com os docentes, um banco de atividades e uma lista de substitutos para resolver esse tipo de emergência.

Cuidar de questões administrativas, financeiras e burocracias em geral
22% acreditam que isso é seu papel, embora os especialistas garantam que a parceria com o diretor deve se restringir aos assuntos pedagógicos.




Os caminhos para a formação de professores

Formar os professores é a principal função do coordenador pedagógico. Veja as melhores estratégias para cumprir essa missão

Gustavo Heidrich (gestaoescolar@fvc.org.br)
Dentro da escola, a função de coordenador pedagógico nem sempre é bem delimitada. Muitos acham que o profissional que exerce o cargo é um auxiliar do diretor para as questões burocráticas. Outros acreditam que cabe a ele resolver os problemas disciplinares dos alunos. E o pedagógico que está na denominação do cargo quase sempre é esquecido. Porém é essa palavra que define a tarefa do coordenador: fazer com que os professores se aprimorem na prática de sala de aula para que os alunos aprendam sempre. Para isso, ele só tem um caminho: realizar a formação continuada dos docentes da escola.
A confusão sobre as tarefas do coordenador - em muitas redes também chamado de orientador ou supervisor pedagógico - está relacionada a concepções diferentes sobre a maneira como ele se torna um bom profissional. Há quem acredite que ensinar é uma vocação e, por isso, o "dom" nasceria com a pessoa. Outros afirmam que ele aprende por tentativa e erro, acumulando experiências de sala de aula. E ainda existem os que defendem que o domínio do "como ensinar" vem da mera reprodução de roteiros prontos de aulas e de atividades. A necessidade de haver formação continuada só surge quando o professor é visto como um profissional que deve sempre aperfeiçoar sua prática ao fazer um trabalho de reflexão sobre ela e tem contato com o conhecimento didático. É aí que surge o papel de formador do coordenador pedagógico, que se torna imprescindível para orientar esse processo.
Para bem cumprir a função, ele deve estar sempre atualizado (o que significa estudar muito) com as didáticas específicas - compostas dos saberes sobre os conteúdos, da forma de ensinar cada um deles e da maneira como as crianças aprendem. As pesquisas sobre elas costumam ser divulgadas em seminários, livros, internet e em diversas reportagens publicadas pela revista NOVA ESCOLA. É com esse conhecimento que o coordenador pedagógico planeja os encontros de formação. Nele, ele tem dois principais caminhos a percorrer: o da dupla conceitualização e o da tematização da prática. Ambos você conhecerá em detalhes nesta reportagem.

Dupla conceitualização
É a estratégia que permite dois aprendizados simultâneos: sobre o objeto de ensino e sobre as condições didáticas para ensiná-lo.
Essa estratégia surgiu dentro da didática da Matemática e os programas de formação mais atualizados estão fundamentalmente apoiados nesse tipo de intervenção. Ela recebe esse nome por permitir que, durante a formação, ocorram paralelamente dois aprendizados: sobre o objeto de ensino e sobre as condições didáticas necessárias para que os alunos se apropriem dos conteúdos, conforme explica a educadora argentina Delia Lerner no livro Ler e Escrever na Escola: o Real, o Possível e o Necessário. Outras áreas também começaram a usá-la, com destaque para Leitura e Escrita, na década de 1990.
A dupla conceitualização envolve duas etapas principais. Na primeira, o coordenador propõe uma atividade desafiadora para os professores. O objetivo é fazer com que eles vivenciem a situação de aprendizagem e identifiquem os conhecimentos que estão em jogo para ensinar determinado conteúdo. Se o tema da formação é o desenvolvimento da competência escritora, é possível propor ao grupo a produção de um texto e, durante o processo, fazer as intervenções necessárias usando os procedimentos envolvidos na construção textual, como o planejamento e a revisão. "Durante essa fase, o formador pode reconceitualizar os conteúdos, tornando observável o que os professores têm de ensinar. No caso da escrita, as intervenções devem mostrar que o conteúdo em jogo não é uma fórmula para ensinar e produzir os diferentes gêneros, mas a construção de competências leitoras e escritoras no aluno", explica Paula Stella, coordenadora do Centro de Educação e Documentação para Ação Comunitária (Cedac), em São Paulo.
Na segunda etapa, o formador mostra como ensinar. Com base na atividade feita pelo grupo, ele promove uma discussão sobre as condições proporcionadas para realizá-la, a maneira como foi feito o planejamento, as intervenções do coordenador e o motivo de elas terem sido usadas - e levanta hipóteses sobre como ensinar determinado conteúdo. No fim, os professores devem ser capazes de planejar um plano de aula ou uma sequência didática para os alunos dentro da perspectiva estudada. "Apesar de serem mais difundidas na Matemática e na Leitura e Escrita, as situações de dupla conceitualização podem ser adaptadas à reflexão sobre o ensino de qualquer disciplina desde que sejam garantidas as duas etapas: a reconceitualização do conteúdo e o modo de ensiná-lo", afirma Regina Scarpa, coordenadora pedagógica da Fundação Victor Civita.
Há alguns anos, Neurilene Ribeiro, formadora do Instituto Chapada de Educação, utiliza essa prática com sucesso durante os cursos de formação de professores e coordenadores pedagógicos que realiza em 30 municípios baianos: "Uso essa estratégia quando percebo que os professores desconhecem os conteúdos ou têm uma visão equivocada sobre eles". Foi o que ela fez ao constatar que os professores do Ensino Fundamental tinham dificuldade em desenvolver procedimentos de estudo e, consequentemente, não sabiam como ensinar os alunos a estudar e a interpretar textos longos e complexos. Ela resolveu realizar uma situação de dupla conceitualização para que os docentes também aprendessem a fazer resumos, uma das maneiras mais eficientes de estudar (leia o depoimento de Neurilene abaixo).
Aprender e ensinar
"Em um curso de formação, incluí uma situação de dupla conceitualização para que os professores aprendessem a resumir e, com isso, pudessem ensinar os alunos como estudar. Levantei as dúvidas e selecionei vários textos sobre como ensinar a ler para estudar, que serviram como referenciais teóricos sobre o objeto de ensino, ao mesmo tempo em que era preciso interpretá-los e resumi-los. Previ a organização do grupo em duplas, momentos de leitura e de tomada de notas, discussão sobre as abordagens de cada autor e a escrita de resumos, que seriam lidos pelos colegas. Na segunda etapa, analisamos os procedimentos usados e as intervenções feitas por mim que tinham ajudado na execução da atividade.
Eles conseguiram identificar algumas, e outras eu precisei explicitar. Com base no que tínhamos discutido, elaboramos uma sequência didática para ensinar os alunos a estudar."
Neurilene Ribeiro, formadora do Instituto Chapada de Educação, de Salvador
Tematização da prática
"Tematizar significa retirar algo do cotidiano, fazer um recorte da realidade, para, então, transformá-lo em objeto de reflexão. É teorizar", explica Telma Weisz, professora, pesquisadora e uma das pioneiras na introdução dessa estratégia no Brasil.
Antes de tematizar sobre a prática, é preciso capturá-la na forma de relatos e registros. Na primeira categoria, estão as escritas profissionais, como os relatórios e os diários de classe elaborados pelos professores. É importante ter clareza de que os relatos são sempre uma impressão da realidade, condicionada pelos saberes prévios de quem os produziu. Com base neles, é possível ter acesso às concepções dos professores. Já os registros são a documentação da prática que não passa pelo filtro ou pela interpretação de um relator. Aí estão as gravações feitas em vídeo ou áudio de uma aula e a observação em sala feita pelo coordenador pedagógico. Por não passarem por interpretação, eles permitem saber o que de fato ocorreu durante a interação entre aluno e professor. Por fim, essa ferramenta também pode ser usada tendo como base o planejamento de projetos didáticos e institucionais, sequências didáticas, planos de aula, rotina, portfólios dos alunos e até o projeto pedagógico - documentos que, ao serem elaborados em parceria entre professores e formadores, possibilitam a tematização em tempo real.
Para que ela aconteça de forma satisfatória, algumas condições básicas precisam existir. Devem ser usadas boas práticas como modelos para análise e discussão. Eles podem ser conseguidos dentro da própria escola ou trazidos de fora. Caso o professor que terá seus registros estudados seja da equipe, ele deverá aceitar os objetivos didáticos da tematização, estar consciente dos ganhos que terá no processo e concordar em socializar seus escritos com os colegas. Esse planejamento é fundamental para que a estratégia não se torne um julgamento da prática sem resultados formativos. "Não adianta registrar uma situação inadequada para dizer aos professores o que não funciona. É preciso ser afirmativo. O ideal são situações das quais seja possível extrair a teoria previamente estudada e os procedimentos aplicáveis a outras situações da mesma natureza", ensina Regina Scarpa. É papel do coordenador trazer as referências teóricas necessárias para embasar a análise durante a formação.
Maria Ivone Domingues, coordenadora pedagógica da Escola da Vila, em São Paulo, faz a formação continuada para os professores especialistas do segundo ciclo do Ensino Fundamental: "Como eles já dominam bem os conteúdos das respectivas áreas, é imprescindível que eu estude as didáticas específicas de cada disciplina para ajudá-los a melhorar a maneira de ensinar".
Em uma atividade de Geometria para o 9º ano, Ivone usou os relatórios dos professores para fazer a tematização da prática. "Notei, durante os encontros de formação, que muitos tinham dificuldade em fazer intervenções quando a turma estava trabalhando com a resolução de problemas que exigiam dedução e muitos simplesmente nada faziam", conta ela (leia mais no depoimento abaixo).
Registros reveladores
"Usei os relatórios das aulas de Geometria para discutir com os professores como intervir quando os alunos estão trabalhando com processos dedutivos. Primeiro, montamos uma sequência didática que levasse as turmas do 9º ano a chegar a alguns conceitos. Nela estavam previstos os agrupamentos que seriam feitos e os conhecimentos que os alunos precisariam ter. Li muito sobre processos dedutivos antes de analisar os relatórios dos professores, que revelavam a atuação deles e os momentos em que tinham dificuldade de intervir. Verificamos que os alunos percebiam que os ângulos inscritos em uma semicircunferência eram retos, mas eles não sabiam explicar o porquê. Concluímos, então, que aqueles eram os momentos certos para a interferência: quando eles demonstrassem precisar
de mais informações para progredir."

Maria Ivone Domingues, coordenadora pedagógica da Escola da Vila, de São Paulo
De todos os tipos de registro, a gravação em vídeo é considerada a que tem o maior potencial formativo. "Ela permite que a prática seja analisada como ela realmente acontece, sem o viés interpretativo ao qual os relatórios estão sujeitos", afirma Paula Stella, do Cedac. Helena Cristina Ruiz, coordenadora pedagógica da EMEI Professora Maria Alice Pasquarelli, em São José dos Campos, a 100 quilômetros de São Paulo, usa com frequência o vídeo para fazer a formação continuada das professoras de sua escola, que ocorre duas vezes por semana, em encontros de duas horas e meia. No começo do ano, ela planeja com toda a equipe a rotina para a creche e a pré-escola. Está prevista a realização de várias rodas de leitura, brincadeiras no parque e cantos de atividades diversificadas. "Por meio da observação da sala de aula, percebi que o que propusemos inicialmente não estava funcionando na maioria das salas. O problema estava na gestão do tempo e do espaço durante os ‘cantinhos’: algumas professoras ultrapassavam o tempo estipulado - fazendo com que a maioria das crianças ficasse cansada - ou tentavam ensinar conteúdos em um momento que deve ser de livre escolha", relata Leninha, como é conhecida na escola. Os cantinhos são organizados com jogos, livros e brinquedos e têm como objetivo estimular a autonomia dos pequenos, que devem escolher onde querem ficar.
Depois de identificar onde estava o entrave, a coordenadora pedagógica foi atrás de um bom modelo. Encontrou-o dentro da própria equipe e decidiu que seria com ele que faria a tematização da prática. "Uma das professoras era muito organizada e criativa nas propostas, sabia como encaminhar as atividades e gerir a sala de uma maneira eficiente e concordou em compartilhar a experiência com as colegas. Juntas, fizemos um planejamento combinando que gravaríamos diferentes propostas, já prevendo as possíveis intervenções que seriam feitas. Gravei meia hora só com as atividades diversificadas que ela fazia com os pequenos", conta Leninha (leia o depoimento dela abaixo).


Bons modelos
"O vídeo foi importante para discutir com as professoras como trabalhar com os cantos temáticos. Gravei as intervenções de uma delas, que tinha um bom procedimento, para ser a base da discussão. Durante a exibição, refletimos sobre como foram feitas a organização da sala e a seleção dos materiais e a maneira de receber as crianças. Pudemos também analisar o papel das intervenções da professora. Discutimos as condições criadas para que os alunos encerrassem as atividades na hora prevista e guardassem os materiais - muitas professoras que estavam em formação tinham dificuldade nessa finalização. A observação do registro em vídeo foi útil para o grupo ter contato com um bom modelo de organização dos cantos. Outra grande lição foi que as educadoras precisavam controlar a ansiedade para não dirigir todas as situações, já que esse tipo de atividade tem como foco a autonomia das crianças."

Helena Cristina Ruiz, coordenadora pedagógica da EMEI Professora Maria Alice Pasquarelli, de São José dos Campos (SP)
No fim: a aprendizagem
Os dois caminhos trilhados - a dupla conceitualização e a tematização da prática - se encontram no fim. Bem trilhados, levam à aprendizagem dos alunos. Ao reconhecer que os professores podem (e devem) construir continuadamente a reflexão sobre a prática e de que a base dos processos formativos são os conhecimentos didáticos que decorrem desse processo, o coordenador é capaz de fazer uso das estratégias de maneira a produzir uma escola dinâmica, independente e capaz de se adaptar constantemente às mudanças e exigências dos processos de ensino e aprendizagem.
Ser formador é oferecer a teoria e as condições para aprimorar a prática. É reunir opiniões e concepções da equipe em torno de um projeto pedagógico. É fazer com que os professores consigam ver além dos hábitos e conceitos adquiridos com a experiência e a formação inicial, por meio da sistematização do que ocorre em sala de aula. "Ao se tornar um formador, dominando as estratégias e o conhecimento didático, o coordenador assume sua responsabilidade e seu papel decisivo para a aprendizagem dos alunos", finaliza Regina Scarpa.
* Leitores que sugeriram a reportagem: Márcia Maria da Silva, São Paulo, SP, Adailza de Souza Melo, Presidente Médici, RO, Gilza Carvalho Soares, Ipatinga, MG, Pedro Garcia Coitinho, Portão, RS, Márcia Siqueira Cabral, Anápolis, GO










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